quinta-feira, 30 de julho de 2009

POESIA VENCEDORA DO FESTIVAL DA POESIA

Retrato
Autor: Luciano Silveira


Não quero o seu retrato,
Gasto, amarelo, empoeirado,
Ele está no chão minado.
Pise com cuidado
Pois meu poema é cabo de enxada
E por isso não quero seu retrato
O berro do boi escondido nas bocas
Tem desabafo, estouro e cansaço.
A boiada tange, range
Arfando o peso na lavra.
O retrato é o mesmo
Na terra gerla das lãs lavrias
No chão revolto da discórdia
E a miséria na minha frente
Matando, engolindo e afogando gente.
Tem denúncias no meu embornal
Para destravar seus olhos
Com minhas rezas e novenas.
Esperando teu progresso no tempo de maio
Ou no mata-borrão da hipocrisia.
No retrato uma família
O pai, a mãe, a filha,
A politicagem jogando todos no precipício
Sem decifrar o homem e o aboio virulento de gotas agrícolas.
Não tem mais importância
Tudo é mais importante que seu retrato.
Seu poema não me convence.
Todos já se armaram de revolta até os dentes
As ruas se abraçam com cheiro de pólvora e
A vida carece de morte para nascer.
Quer importa o conflito e o boato?
Para que o seu retrato, seu parecer, sobre meu sertão?
Se dilua com meu povo.
Dance, cante até cansar..
Nosso povo é um rio que não tem pressa de
Virar mar
Lembra dos fatos.
Conheça essa gente.
Mas...
Rasgue o seu retrato.

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